COMA

Você já viu? Já olhou bem de perto?

Sim, parece que ainda é lindo, e deve estar tudo bem. Mas daqui, de onde vejo, não se pode ter tanta certeza.

Há água de berinjela com limão, iogurte, goiabada, creme de leite, biscoito, cerveja, Montilla e até doce de figo na geladeira. Não se aproveita muito no verão, porque faz muito calor, e tudo o que se quer é estar na brisa, sentir o mar. Respirar. Água bem gelada sempre serve muito, sempre serve mais. Mas quem disse que a sede passa? E quem disse que a fome vem?

Eu não sei o que você pensa que está fazendo, mas não está funcionando. Não pra mim.

Deveríamos conversar. A sós. E não estamos falando de mim e do meu vazio.

E agora? Será que te odeio? Sim, porque, amor, isso não é. Cansada de dizer isso antes.

Mas sempre há o mar, e as cores, e a noite, com suas luas, todas minhas e tudo tão meu. Mas... onde está a minha poesia? Sem amor, sem você, eu não sei nada do que fazer com tudo isso.

Eu ouvi uma música, não é nossa, nem sei se conhece, mas faz um bom sentido. Eu fico ouvindo na minha mente, enquanto durmo, e quando acordo; e vejo, rindo, porque cada letra, cada verso, nos cabe tanto... “Não se ama, amor, em vão”... e me vem uma saudade, uma coisa nova, de toda a velharia que nos une ao nada que somos.

E é isso, como me reconhecer sem você nisso tudo? Que maluquice, nem é mais insistência, já é burrice demais até. Mas é essa coisa estúpida, que nem dói, nem é bom, que não vai e nem passa, e não deixa o novo chegar.

Foi um ano muito bom, trânsito em estradas pedagiadas, sem blitz e com licenças. E também de bolsa, casa nova, tudo arrumadinho, compras de mês, contas a pagar e TV de madrugada a cabo.  É maravilhoso, diferente, mas ainda não é isso, porque é sempre um caminhar vazio, eu estou sempre faltando.

E é por isso que eu nem escrevo mais por esses tempos. Estou farta desse rebobinamento, desse caralho de disco riscado, desse cinza constante e cruel. Eu queria um transplante, uma transfusão, um novo mar, mais um amar. Uma espécie de salvação abrupta e desleal, uma parada cardíaca, uma reanimação. Uma alma emprestada, dada, traficada, porque a minha, já foi, já deu.

Meu deus, eu preciso de uma respiração boca-a-boca!

Gilda. 27.01.2014.

Comentários

  1. Estou me vendo toda nesse fragmento, a mim e a baixinha.
    Relacionamentos são o drama eterno da vida, mas, como diz a voz de quem sou par, vai ficar tudo bem. O tempo sempre nos reorganiza.
    Se tiver que acabar, que acabe e que fique a história, e que fique o carinho, e que fiquem as boas lembranças e que fiquem os repetitivos "e".
    Se não você e ele, senão eu e L, ao menos, eu e você que somos quem somos e nos temos numa amizade preciosíssima.
    Que fique também, Gilda, o amor, porque esse nunca vai, ainda que se fixe, com o piedoso tempo, apenas no bloco mágico da memória.
    No depois é que está o que o futuro nos reserva, mas, clichê, ou não, o cultivo é agora.
    não dá pra viver junto? Então vamos fragmentar!

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